
Estudo aponta deficiência em tecnologias que prometem reduzir emissões na pecuária
Soluções tecnológicas para reduzir impacto ambiental da produção de carnes atraem mais recursos, mas têm menos impacto do que soluções baseadas na natureza. FAIRR Iniciative avaliou 22 técnicas aplicadas globalmente na criação de gado e na produção de rações para a redução de emissões
Tornou-se um mantra entre as empresas de carnes nos últimos anos afirmar que a solução para reduzir as emissões de gases de efeito estufa na pecuária é a tecnologia. O discurso tem convencido empreendedores e financiadores, que gastam tempo e recursos em soluções tecnológicas para reduzir o impacto ambiental da atividade. Mas um grupo relevante de investidores avalia que essa saída é menos eficiente — e, em alguns casos, pode ser até contraprodutiva. A FAIRR Iniciative, que reúne mais de 400 gestoras e investidores globais com mais de US$ 75 bilhões em ativos sob gestão, avaliou 22 técnicas aplicadas globalmente na criação de gado e na produção de rações para a redução de emissões.
O estudo foi feito com a Climate Policy Iniciative (CPI) e o Vibrant Data Labs. A conclusão é que a maioria das soluções tecnológicas aplicadas nas fazendas tem baixa eficiência e pode ter até um efeito indesejado, ao aumentar a produção e as emissões totais. Das 10 soluções analisadas, sete incorrem nesse problema. Contudo, as opções tecnológicas recebem mais recursos do que as soluções baseadas na natureza. De forma geral, soluções tecnológicas receberam 55% dos recursos públicos para alternativas de mitigação dos problemas ambientais nas fazendas contra 45% das soluções baseadas na natureza.
O capital privado tem ainda maior predileção por soluções climáticas tecnológicas: 67% dos recursos de venture capital e filantrópicos dos EUA vão para soluções baseadas em tecnologia, contra 33% para as baseadas na natureza. A tecnologia que mais atraiu capital privado foi a de melhoramento genético de culturas agrícolas para ração. Uma das soluções tecnológicas já aplicada, com retorno financeiro de médio prazo, é a produção de biogás a partir de resíduos animais e agrícolas. O estudo observa que, ainda que a técnica dê um destino aos resíduos, há “forte evidência” de efeitos colaterais, já que a biodigestão pode acabar incentivando a criação intensiva de animais e aumentando a concentração de resíduos.
A mesma lógica se repete no caso dos aditivos sintéticos para ração que reduzem a produção de metano na fermentação entérica dos animais. Segundo o estudo, essa solução pode ajudar a intensificar os sistemas de produção. Em compensação, pesquisas para desenvolver aditivos naturais para reduzir a produção de metano, que ainda não estão no mercado, já recebem mais financiamentos — ao menos do capital privado. O estudo também cita a adoção de melhoramento genético de animais. Embora a técnica seja a quinta mais beneficiada por recursos públicos destinados para soluções climáticas nas fazendas nos EUA, a seleção genética reduz apenas o índice de emissões de gases-estufa por cabeça.
Mas, ao aumentar a produtividade de um animal, também cresce o consumo de ração e outros insumos, o que resulta em mais emissões na cadeia, de acordo com análise do Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas (IPCC). Já as soluções baseadas na natureza são mais efetivas no longo prazo e são lucrativas, concluiu a FAIRR Iniciative. Entre essas técnicas estão o uso de culturas de cobertura na entressafra de grãos, rotação de culturas, plantio direto e uso de insumos orgânicos. Tais soluções podem melhorar o aproveitamento da água no solo tanto quanto tecnologias de eficiência de irrigação, com a vantagem de terem mais impactos ambientais positivos, diz o estudo. Mas essas técnicas naturais recebem apenas 7% do capital público direcionado globalmente a intervenções climáticas nas fazendas, enquanto sistemas de eficiência de irrigação recebem 29% desse capital, sendo o principal destino de recursos para soluções climáticas nas fazendas, de acordo com o estudo.
Globo Rural
Foto: Imprensa Sindicarne-Goiás